Eric Clapton sempre me lembrou minha infância. Uma alusão feliz e memorável ilustrada pela imagem dos meus pais dançando juntos na sala da minha casa, alegrando espontaneamente meus finais de semana. Entre uma dança e outra, meu pai se arriscava no teclado e violão e ainda soltava a voz acompanhando Eric ao fundo. Minha mãe ficava admirando seus dotes musicais e embalava no blues com gestos totalmente desengonçados e fora do ritmo, mas incrivelmente charmosos.
De sábado a domingo, o apartamento mais animado do prédio era um verdadeiro show de música de qualidade: Eric, BB King, Steve Ray Vaughan e sempre fechava ao som de Rolling Stones, sem dúvida a banda número 1 do meu pai.
Não tinha como evitar. Me tornei uma apaixonada incondicional pelo Eric Clapton. Infelizmente ele não sabe disso, mas eis que nessa última segunda-feira (que ironia! Logo no famoso pior dia da semana), atravessei o túnel, encarei um mega, hiper, ultra trânsito para a Barra, corri contra o tempo (porque para variar estava atrasada), abandonei meu carro num terreno baldio e esburacado e me joguei na imensidão do HSBC Arena (a casa de show mais longe do Rio) só para ver, ouvir, sentir e praticamente declarar meu amor enclausurado durante tantos anos ao lindo, charmoso, elegante, sofisticado, o gênio do blues: Eric Clapton!
Minha câmera não tinha zoom, mas eu juro que era ele lá no palco! |
Parecia um sonho. Eu estava a alguns passos do homem que sempre achei ser um mito, uma lenda, intocável, inatingível, de tão perfeito, quase inverossímel. Quando a ficha finalmente caiu de que eu realmente estava num show do Eric Clapton, relaxei, voltei da lua para a Terra e foi aí que me toquei do único, porém o maior e estrondoso erro da noite. Era um show SENTADO! Digo, 100% sentado! Como pode isso? Lógico que eu sabia que tinha um lance de cadeira marcada e tudo mais, mas na lógica do meu raciocínio, seriam cadeiras com mesas e espaço à vontade para quem quiser requebrar no blues. Mas não! Estávamos presos em cadeirinhas minúsculas de plástico, enfileiradas com um palmo de distância. Para você ter uma ideia, cinema e teatro são um luxo perto daquilo! As pessoas eram obrigadas a tentar dançar na cadeira, no máximo batendo palmas ou tentando entrar no ritmo com o ridículo de tão pequeno e mísero ato de estalar o dedo.
Aloooouuu galerinha da produção!!! Show de blues é para dançar! Isso significa mexer pernas, braços, gingar o corpo inteiro! Não existe ver Eric Clapton como se estivéssemos assistindo a um jogo de tênis na França. Silêncio absoluto e meros aplausos quando finalmente sair um ponto.
Estalar os dedos ouvindo Cocaine??!! Não sou tão britânica assim. É lógico que foi um showzasso e curti cada acorde da guitarra do rei. Mas meus pézinhos ficaram insaciáveis do início ao fim e frustados por não poderem rodopiar na pista. Só me resta esperar o final de semana chegar e preparar a vizinhança porque Bruno e Fernandinha vão arrasar nos passos de blues com volume no máximo, estremecendo os vidros e paredes do apê e afagando meu coração com eternas lembranças de infância.