É interessante como as pessoas se cumprimentam, já reparou? É um diálogo de apenas duas frases feito somente de uma mesma pergunta.
Uma cena comum: estou passando por algum lugar, que aliás é totalmente irrelevante, provavelmente mexendo no celular como de costume até que avisto alguém conhecido.
- Oi, tudo bem?
E ele "responde": - Oi, tudo bom?
E pronto, assim acaba a cena esquizofrênica. A pergunta é exatamente a mesma e a resposta é nula. E o pior, continuo caminhando como se fosse super normal perguntar algo e ser retrucada com a mesma pergunta. A recíproca é verdadeira. A única variação possível é trocar o "tudo bem" por "tudo bom" e olhe lá.
Quando me dei conta de tal insanidade, realmente me incomodei e resolvi quebrar paradigmas, revolucionar o mundo, atravessar as barreiras impostas pelas leis sociais até que... pronto, o momento ficou fadado ao mistério. Eu finalmente respondi que "sim, está tudo bem comigo!". Ficamos nos olhando durante uns dois segundos.
Ele mexia as sobrancelhas como se não entendesse o que acabou de se passar. Decidi ir mais adiante.
- Mas e você? Não me respondeu. Tudo bem?
As sobrancelhas se revezavam numa espécie de sacolejo coreografado. Se pudesse se ver ia perceber que ele sim era o estranho da cena e não eu. Sem muita saída para fugir do silêncio constrangedor, disparou de uma só vez:
- Estou bem.
Baixou os olhos e nitidamente estarrecido com a situação inesperada continuou seu caminho e voltou a teclar em seu iPhone, onde provavelmente embalava livre e solto nas conversas do whatsApp.
Ri sozinha até que instantaneamente o som de uma nova mensagem sinalizou no meu celular. Ah, um novo whatsapp... Não é que era o tal conhecido?! Olhei para trás e o vi já de costas a uns bons metros de distância mas agora, devidamente protegido pela telinha do telefone.
- Oi Fê, desculpe estava com pressa. Mas agora posso falar. Estou bem sim, entrei num novo negócio, está dando muito certo. Ah e você não sabe! Minha irmã casou e está gravida! Vai ser um menino. Nós acabamos de voltar de Nova York, foi a família toda. E você? Me conta como está!
Quanta desenvoltura para uma conversa por celular, não? Pois bem... Quer saber qual foi a minha resposta? Não há muito o que pensar. Se a pergunta foi "e você? Me conta como está", nada mais normal que responder:
- E você? Me conta como está!
As sobrancelhas certamente voltaram a sacolejar.