Era uma sexta-feira de sol e o que eu mais temia aconteceu. A professora Helena pediu silêncio e proclamou cheia de pompa e orgulho: "a grande vencedora do concurso de poesia de 1994 é... Fernanda Conde Novaes". Um silêncio agonizante invadiu meu corpo e lá eu me vi, paralisada, no foco dos mais de cem olhares atentos e curiosos direcionados ao meu rosto pálido, já quase sem vida.
Enquanto alguns amiguinhos se contorciam no auditório indignados com a derrota para a garota mais tímida de toda a quarta série, eu deixava aos poucos meu corpo deslizar sob a cadeira. Queria perfurar o chão com meus pés e desaparecer daquele horror.
Quem disse que eu queria ganhar aquela merda? Não, nunca, jamais! Apenas tive que escrever uma poesia, totalmente à força só porque valia nota no boletim. A professora sequer nos avisou que o texto seria alvo de competição. Não gosto de disputas e não estou nem aí para saber quem é o melhor ou o pior. Sempre fui café com leite e não tenho o menor problema com isso. Mas dessa vez não tive colher de chá. A café com leite ia ter que enfrentar o palco e fazer quase um milk shake de tanto jogo de cintura que precisava para vencer o medo do microfone e ler a poesia.
Pernas trêmulas, mãos geladas e um mix de manchas vermelhas nas bochechas como se estivesse à beira da morte por um ataque fatal de alergia. Peguei o microfone e mandei bala. Entre uma frase e outra me segurei para não disparar ensandecida em direção à porta. Minha mãe na plateia se esgoelava emocionada com direito a soluços e olhos encharcados. Meus coleguinhas não demoraram muito a perceber e logo já gargalhavam alto apontando para a maluca do auditório aos prantos. A timidez se multiplicou por três.
Quando finalmente chego ao fim do poema, uma voz emana: "temos que levar essa menina ao Jô Soares!". Oi??? Como assim??? Pagar esse mico em rede nacional??? Vocês querem que eu me interne? Naquele momento uma internação psiquiátrica não me parecia uma má ideia, contanto que fosse possível evaporar dali.
É claro que eu me safei do programa do Jô, mas depois soube que a ideia partiu da própria professora Helena, que além de me botar naquela furada, ainda queria transformar a matuta aqui em pop star, vê se pode? Não sei por onde ela anda, mas depois de quase 20 anos me veio sua lembrança logo hoje, no dia do mestre. Uma data verdadeiramente merecida para a mentora que me fez padecer de vergonha mas que me ensinou uma arte que levo para o resto da vida: o amor à escrita. Um parabéns cheio de saudade a todas as professoras Helenas!