Noite sim e noite sim também eu sonho que estou matando aula. Não é exagero. No meu inconsciente sou a líder mundial do turismo escolar. Na verdade, o ambiente até que é bem variado. Mato aula no Colégio Santo Agostinho, na PUC, no curso de inglês e até em lugares que nunca estudei. Essa noite por exemplo sonhei que matava uma aula do Colégio Wakigawa. Não sei se isso que chamavam de "escola" ainda existe, mas me lembro que ali sim era o grande império internacional de matadores de aula.
Já foram tantas noites de matanças que hoje me peguei refletindo sobre o porquê dessa fixação. Até confesso que na minha fase de estudante tive mesmo algumas fugas secretas, mas meu currículo não chegou a ser de uma homicida em série. Eram matanças espaçadas, digamos assim. Lapsos que quando aconteciam, admito, me mergulhavam num prazer inenarrável. Ao contrário de muitas amigas, eu não matava aula para aprontar coisas ilícitas, se é que vocês me entendem. A lacuna acadêmica era totalmente preenchida com horas e horas de sono. Que delícia!
Dormir à tarde depois de almoçar bife com batata-frita ao som de Chaves no SBT era pura volúpia. Quanta felicidade! Me deleitava em saber que enquanto isso todos reviravam os olhos na aula de trigonometria. Ainda assim o maior prazer vinha mesmo do espírito "ilegal" implícito em matar aula. Era uma forma maravilhosa de transgressão. Contra a lei dos pais, dos professores e dos amigos invejosos que nunca conseguiam brecha para burlar a única obrigação que tínhamos. Eu matava aula na minha própria casa, quanto luxo! Contanto que meu pai e nem meus filhos no futuro leiam esse texto, admito, com as bochechas rosadas de vergonha, que matar aula era realmente um dos meus melhores atributos.
Aposentei minha carteirinha de estudante há uns anos mas o prazer de matar aula definitivamente não abandonou meus sonhos. Trigonometria, fórmulas de química, leis da Física, está tudo lá no meu inconsciente. Aulas que não me serviram tanto para a vida, mas que alimentam uma incrível sede de transgressão. Mesmo que em fantasia.